A prisão de Steve Bannon, ex-conselheiro de Donald Trump, guia dos Bolsonaros e mentor de uma pretensa “Internacional Iliberal”, na manhã de 20 de agosto, envolto em um esquema fraudulento de arrecadação de fundos para a construção do muro que apartaria o “império” da “barbárie” (o muro na fronteira com o México), tem profundos significados políticos, para além de seus rebatimentos imediatos na difícil campanha presidencial que a ultradireita norte-americana tem enfrentado, dada a incapacidade de geração de emprego e renda, os resultados da desastrosa guerra comercial deflagrada contra a China e a atuação mambembe de seu governo frente às pilhas de morto(a)s contabilizado(a)s, diariamente, na casa dos milhares. Tampouco se trata de vitória do campo progressista na luta antifascista que tem sido travada em diversas realidades. São rearranjos operados desde a institucionalidade burguesa, pelos agentes políticos do financismo.
Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a pandemia do coronavírus segue crescendo e está presente em todas as comunidades do mundo, o Brasil se aproxima dos Estados Unidos (líderes mundiais no morticínio por Covid-19) na contagem do(a)s morto(a)s: 172.934 contra 111.100, enquanto se igualam no número de morto(a)s por 1 milhão de habitantes, em 523 (dados de 20 de agosto). No relatório mais recente, de 10 de agosto, a OMS afirmou a existência de 166 vacinas sendo desenvolvidas em diversos países, dentre as quais apenas 30 estariam em testes clínicos e, destas, 6 (seis) na terceira e última fase. Um dia depois de divulgado o relatório, o governo russo anunciou o registro da primeira vacina contra o Covid-19 (que no relatório apareceu ainda na fase 1), saindo à frente do Reino Unido, China, EUA e Alemanha, que no relatório teriam vacinas sendo testadas já na fase 3.
Ainda assim, não se sabe quando a vacina russa chegará ao mercado e por meio de quais mediações políticas, a fim de que esteja disponível aos estratos mais vulneráveis em diversas realidades, aquele(a)s que padecem da falta de leitos de UTI e de respiradores para sobreviver.
À tragédia social acentuada pela crise sanitária do núcleo orgânico à periferia do sistema mundial, no Oriente Médio se somam os 177 morto(a)s, mais de 6.650 ferido(a)s, os escombros e estruturas retorcidas da explosão que devastou o porto e boa parte da cidade de Beirute, no dia 4 de agosto e que se especula tenha sido causada por 2.750 toneladas de nitrato de amônio apreendidas, em 2013, em um navio proveniente da Moldávia.
Da mesma forma essa tragédia se alastra à Leste, com as revoltas populares na Belarus, após 26 anos de governo Lukashenko e uma eleição sob controle direto de seu regime, conferindo-lhe vitória eleitoral de 80% no momento de maior sublevação popular de sua história. Enquanto Bolsonaro desdenha do(a)s morto(a)s por Covid-19 indagando “e daí?”, prescrevendo cloroquina (enquanto seus(suas) apoiadore(a)s propõem a introdução de ozônio pela via retal), Lukashenko ganhou notoriedade por indicar vodca e sauna para um vírus que chegou a afirmar nunca ter existido porque jamais o teria visto, compondo o seleto grupo, ampliado por Trump e Ortega, de presidentes negacionistas frente à maior crise sanitária de todo um século.
O levante popular que ali se dá, desde as suspeitíssimas eleições, se inscreve na maior crise social e política ali já registrada, respondida pela forte repressão que tem encarcerado e brutalizado manifestantes às centenas, contabilizando já morto(a)s entre operário(a)s, estudantes e intelectuais.
O Governo Bolsonaro se destaca entre os presidentes negacionistas, reivindicando que devemos “tocar a vida” passando por cima de mais de 111 mil morto(a)s, deste(a)s já são mais de 690 indígenas morto(a)s e infectado(a)s mais de 26 mil. O povo Cigano, segue marginalizado e a desumanidade expressa no “lucro acima das vidas” marcam a violência contra os Quilombo dos Macacos na Bahia e o Quilombo Campo Grande em Minas Gerais, e por fim uma menina de 10 anos que teve sua infância negada, necessitando de uma intervenção médico/hospitalar, teve seu direito constitucional de atendimento negado pelo Hospital Universitário da UFES que é administrado pela Ebserh. Vimos uma juíza determinar sua sentença a um homem de 42 anos, considerando a sua cor da pele, o mesmo racismo estrutural tirou a vida de Miguel, João Pedro e colocou as trabalhadoras Domésticas e Diaristas como serviço essencial quando o isolamento social é fundamental para não adoecerem. Não à toa foi uma mulher negra empregada doméstica a primeira vítima da Covid-19 no Rio de Janeiro.
No momento que passamos dos 100 mil morto(a)s, com a crítica as fraudes no auxílio emergencial e das desastrosas falas do presidente, saiu a pesquisa da Datafolha realizada em 11 e 12 de agosto, com 2.065 brasileiro(a)s adulto(a)s que possuem telefone celular em todas as regiões e estados do país, são 37% os que acham o governo ótimo e bom. Em junho, eram 32%. No mesmo período, caíram de 44% para 34% os que o consideram ruim ou péssimo. A aprovação subiu 5 pontos, e a reprovação caiu 10: uma mudança de 15 pontos favorável ao governo. Desde que assumiu essa é a primeira vez que há um crescimento na avaliação positiva do governo. As avaliações são diversas, mas há consenso em alguns pontos: o auxílio emergencial pesou, o governo mudou a sua postura e a pandemia, lamentavelmente, está sendo usada de forma a beneficiar o Governo.
Nesse contexto nossas Universidades, IF e CEFET as gestões e administrações universitárias começaram a impor medidas que distorcem a característica fundamental da formação pautada no tripé ensino, pesquisa e extensão, trazendo as possibilidades do ensino remoto. A imposição da transposição do ensino presencial para o ensino remoto foi se fortalecendo e ampliando em todas as instituições de ensino superior públicas, sem considerar o amplo debate com a comunidade acadêmica, um diagnóstico social, econômico com elementos objetivos e subjetivos e de acesso do(a)s discentes, docentes e técnico(a)s administrativo(a)s. Precisamos resistir a esse “novo normal” e a imposição de um ensino deslocado de um projeto de educação pública de qualidade e inclusiva.
Também precisamos estar unificado(a)s e disposto(a)s para lutarmos contra o corte previsto para a educação superior no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), que tramitará no Congresso Nacional. Para o orçamento de 2021, o Ministério da Educação pretende cortar parte das despesas com gastos discricionários para este setor (custeio, investimentos e Assistência Estudantil), que representa 18,2% e deve chegar à cifra de R$ 1,4 bilhão, em comparação ao orçamento de 2020.
Nesse contexto de ataques ao orçamento da pasta de Educação em um golpe só, o governo Doria pretende extinguir 10 autarquias, fundações e empresas públicas, cujos serviços passariam a ser delegados a empresas privadas. Dentre elas, estão a Fundação para o Remédio Popular (Furp), a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo (CDHU), a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU), a Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), o Instituto Florestal e o Instituto de Medicina Social e de Criminologia (Imesc). O que ocorre em São Paulo e os ataques as Fundações de Fomento à Pesquisa não é um caso isolado! Nos Estados da Bahia e Paraná, por exemplo, temos movimentos parecidos para desestruturar as Universidades Estaduais, explicitando que os ataques à educação não são apenas uma característica do Governo de extrema-direita.
Mas estamos com disposição para resistir e sairmos da defensiva! No Seminário do FONASEFE, foi indicada a construção de um Dia Nacional de Lutas com greves e paralisações nas três esferas do funcionalismo (municipal, estadual e federal) e empresas estatais, em diálogo com o movimento estudantil e movimentos sociais para a segunda quinzena de setembro. A Reforma Administrativa que querem nos impor receberá uma resposta à altura com a organização das categorias do funcionalismo público e uma campanha de defesa dos serviços públicos!
A difícil conjuntura que vivemos não pode significar que não há esperança! Pois tivemos pequenas, mas pontuais vitórias! A pressão popular e o movimento antirracista obrigou a juíza racista a se retratar; a campanha #AdiaEnem foi vitoriosa; a derrubada do veto presidencial a regulamentação da profissão de historiador(a); a saída de Weintraub; ADPF que provocou o STF e impôs mudanças na política de segurança pública no RJ; o FUNDEB que passou na CF e foi pro Senado; a prisão de Sara Winter, que afirma publicamente pretender “ucranizar” o Brasil, e a sua posterior manutenção em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica. A polícia do DF desmontou o aparelho de treinamento paramilitar em Brasília, assim como o acampamento do mesmo grupo na Praça dos Três Poderes. E houve também a repressão, mesmo que a posteriori, de líderes do ataque com fogos ao STF e o bloqueio parcial do sistema de Fake News que utilizava, inclusive, verbas públicas.
Devemos continuar ousando lutar, pois assim venceremos!
Brasília(DF), 21 de agosto de 2020
Diretoria Nacional do ANDES-SN