Apesar de insuficiente, acordo é vitorioso em relação à proposta de 27 de maio e tentativa frustrada de ultimato do governo sobre o movimento paredista. Ganhos políticos da greve demarcam momento histórico do movimento
O Comando Nacional de Greve (CNG) do ANDES Sindicato Nacional indicou às bases a saída coletiva da greve até o dia 3 de julho. A orientação atende ao que foi deliberado pela maioria das assembleias gerais realizadas nas bases, entre os dias 17 e 21 de junho: 35 assembleias deliberaram pela construção coletiva da saída da greve, enquanto outras 20 indicaram a continuidade da greve.
As assembleias também deliberaram pelo aceite da proposta apresentada pelo governo em 14 de junho, após ANDES-SN e Sinasefe forçarem a retomada das negociações em 3 de junho e desmascararem a farsa do acordo assinado em 27 de maio entre o governo e a entidade fantoche Proifes – suspenso dois dias depois pela Justiça Federal.
Com a pressão da greve, foi garantido o avanço sobre pontos cruciais como a revogação da Portaria n.º 983/2020 para garantir isonomia entre docentes da carreira EBTT e do Magistério Superior em relação ao controle de frequência e a carga horária de ensino.
Além disso, o governo prometeu suspender recursos judiciais, pelo governo federal, frente às decisões que conferiram o RSC para aposentadas e aposentados que não recebiam o benefício, incluir entidades no Conselho que trata do RSC; e estabelecer regras padronizadas para progressão e promoção (o que pode significar a revogação da IN 66).
Quanto à pauta salarial, a reivindicação de reajuste em 2024 não foi atendida, assim como a defesa do reajuste linear conforme os índices da contraproposta protocolada em 27 de maio. Mesmo assim, apesar de todas as contradições, se coloca como um avanço resultante da luta grevista a elevação dos valores de reajuste incorporados pelo governo: o reajuste linear oferecido até 2026 passou de 9,2% para 12,8%; o reajuste dos steps passou de 4% para 5% até 2026; o valor salarial para ingressantes na carreira docente (MS e EBTT) também foi elevado.
Para Jennifer Webb, 1ª tesoureira do ANDES-SN, a mobilização da categoria avançou, superando grandes desafios. “Caminhamos os passos que nossa categoria organizada e mobilizada conseguiu dar em um contexto de dificuldades de articulação e de necessidade de organização da classe trabalhadora”, avalia. E completa: “Essa greve marca a história como aquela que avançou mesmo com a intransigência e a negativa por parte do governo”.
Organização do movimento docente
Em comunicado expedido na noite de 23 de junho, o CNG do ANDES-SN aponta que um dos maiores avanços conquistados pela greve em 2024 foi a escalada da mobilização docente, registrando considerável aumento da participação da categoria nas assembleias e atividades de luta, inclusive com a ampliação da sindicalização no ANDES-SN.
O documento destaca, ainda, que a greve possibilitou o debate sobre as questões centrais da categoria, como salários e carreira; a isonomia entre ativo(a)s e aposentado(a)s; pautas centrais do revogaço; a diminuição significativa dos orçamentos das universidades, institutos e cefets, impactando as condições de trabalho, fragilizando e comprometendo a permanência estudantil e o funcionamento das instituições.
A greve também ampliou o entendimento da categoria sobre a disputa do projeto de sociedade e por fundos públicos, bem como a luta contra o Novo Arcabouço Fiscal (NAF), como elementos estruturais da defesa de instituições de ensino superior públicas, laicas, gratuitas, de qualidade, democráticas e socialmente referenciada.
“Nos debruçamos nos dias 22 e 23 de junho nas deliberações das Assembleias de base do ANDES-SN. Foram 59 seções sindicais que realizaram suas AGs, analisaram a conjuntura e indicaram os rumos da greve para o Sindicato Nacional. As deliberações no âmbito do CNG do ANDES-SN reproduzem as decisões da base e essa é a grande força desse Sindicato”, aponta Susana Maia, Secretária-geral da Aduff SSind e integrante do CNG do ANDES-SN.
Governo: da intransigência ao recuo
Em todo o processo de construção da greve e condução do processo negocial, a intransigência do governo foi o que mais causou indignação ao movimento grevista não só pela truculência, mas também pelo uso da entidade fantoche Proifes como braço sindical para desarticular a greve da educação federal, escancarando sua disposição às práticas antissindicais.
Em 15 de maio, na 5ª rodada da Mesa Específica Temporária, o governo sustentou que a proposta apresentada seria a última e que não haveria mais espaço para negociações. Foi informado pelo secretário de Relações de Trabalho do MGI, José Lopes Feijóo, que a data limite para assinatura do acordo, pelas entidades da Educação seria o dia 27 de maio e seria assinado “com qualquer um”, sinalizando a possibilidade de repetir a mesma postura adotada em 2012 e o prazo estabelecido, entendido como término de diálogo com a categoria.
A postura foi reafirmada em mensagens de e-mail enviada ao ANDES-SN e Sinasefe em tom ultimatista no dia 21 de maio, alertando para o fim do prazo de assinatura em 27 de maio.
Na data referida, em local não divulgado para a bancada sindical, o governo assina acordo com a entidade cartorial, no que pode ser considerado uma tentativa de golpe contra uma greve legítima. O acordo foi suspenso pela Justiça Federal dois dias após assinatura e uma semana depois, a entidade fantoche conseguiu, de presente do governo, o registro sindical que tentava há mais de 10 anos e, assim, tentar suscitar a perda de objeto da suspensão do acordo, junto à Justiça Federal.
Acuado pela pressão da greve, o governo volta à mesa de negociação em 3 de junho e sustenta posição pelo fim do diálogo. ANDES-SN e Sinasefe ocupam o MGI e afirmam: só sairiam quando nova reunião fosse agendada oficialmente. O governo recua novamente e agenda o encontro para 14 de junho.
Em 14 de junho, pressionado e sob críticas pelos ataques às entidades e dirigentes grevistas proferidos por Lula dias antes (10/6) no anúncio de liberação de R$ 5,5 bilhões para o orçamento da Educação, o governo mais uma vez cede e o movimento conquista avanços importantes em pontos não salariais da pauta da greve junto ao MGI e ao MEC.
Como avalia o CNG em comunicado expedido, “na forma e no conteúdo, a mensagem política do governo é eloquente, recrudescendo seu ataque ao movimento paredista e demarcando seu compromisso com o grande capital, caracterizando o cenário político, no qual não temos condições de avançar na correlação de forças por meio desta greve”.
Encaminhamentos
Com o resultado das assembleias gerais apontando majoritariamente pela saída da greve, o Comando Nacional de Greve indicou calendário para a próxima semana, sendo o 26 de junho a data de assinatura do acordo com o governo e nova rodada de assembleias até 3 de julho, para que as bases definam o dia de saída da greve em suas respectivas instituições. O CNG será dissolvido em 27 de junho, e os Comandos locais permanecem em atividade até o encerramento da greve em cada instituição.
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