O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, recuou em desmontar a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). A decisão ocorreu após uma série de manifestações dos povos indígenas realizadas essa semana em todo o país.
Pressionado pelas mobilizações, Mandetta se reuniu com lideranças indígenas em Brasília, nessa quinta (28). O ministro garantiu aos indígenas que vai, ao menos por enquanto, recuar da proposta de desmembrar a Sesai. E, também, de modificar o modelo de atendimento de saúde às comunidades indígenas.
A semana foi marcada por manifestações contra a proposta de municipalização da saúde indígena em todas as regiões do país. Foram registrados pelo menos 30 atos em ao menos 18 estados brasileiros, com a participação de inúmeros povos e comunidades indígenas.
Após a reunião com as lideranças indígenas, o ministro Mandetta garantiu que “a Secretaria de Saúde Indígena deve permanecer”. Segundo ele, a proposta de fusão com uma nova secretaria seria abandonada pelo ministério.
“A gente entende que tudo que ele disse foi por conta dessas mobilizações nas bases, todos esses protestos. Até ontem, não tinha nada agendado com o ministro. Com a pressão da mobilização, conseguimos arrancar a reunião para hoje e, com ela, garantimos esse anúncio. Se está o Brasil inteiro parado, é porque a insatisfação é geral”, afirma Sônia Guajajara, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Apesar da fala de Mandetta, a liderança também ressalta que não há garantias além da palavra do ministro. Por isso, o movimento indígena deve se manter em alerta.
“A gente não tem garantia de que ele vai manter a posição, já que tem mudado sempre o seu discurso. Por isso, temos que nos manter mobilizados, porque esse vai ser um ano de luta. Teremos que seguir firmes fazendo esse enfrentamento”, avalia.
Sesai na mira
Desde o início de sua gestão, Mandetta vinha defendendo a descentralização da saúde indígena, com repasse de do atendimento a municípios e estados. Também queria o desmonte da Sesai, com sua possível fusão em uma secretaria mais ampla, voltada à “atenção básica e saúde indígena”.
No início dessa semana, Mandetta defendeu uma revisão do modelo de saúde diferenciada e federalizada para comunidades indígenas fora da Amazônia. O posicionamento, que é rechaçado pelos povos indígenas, ocorreu durante audiência na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado.
“Em São Paulo, será que há necessidade da União [atuar] na nossa maior cidade? É essa a discussão que a gente tem que colocar”, afirmou o ministro na audiência.
Enquanto Mandetta falava no Senado, os Guarani da Terra Indígena Jaraguá ocupavam a prefeitura de São Paulo contra a municipalização da saúde indígena.
Segundo a coordenadora da Apib, durante a reunião, bastante “tensa”, Mandetta seguiu defendendo sua posição original. “O ministro insistiu na história de que se precisaria de um modelo diferenciado, mas todas as regiões foram firmes em afirmar que é preciso um sistema único. O que se precisa é aprimorar e melhorar esse atendimento”, relata Sônia Guajajara.
Outro ponto trazido pelo ministro foi a proposta de criação de um Grupo de Trabalho (GT), cujo funcionamento ainda será discutido. O GT irá avaliar as dificuldades e propor soluções para a saúde indígena. Os indígenas, por sua vez, reafirmaram a necessidade de respeito às suas instâncias de consulta.
“Nós falamos que isso tem que ser levado para a Conferência Nacional de Saúde Indígena, que é nosso fórum maior de consulta e deliberação”, destacou Sônia. A Conferência Nacional será o momento culminante de uma série de reuniões já realizadas em conferências locais e regionais em todo o país. O evento está marcado para maio de 2019.
Para Kahu Pataxó, liderança indígena da Bahia é importante manter a atenção e a mobilização. “A fala do ministro é muito vazia. O que ele traz de concreto é essa proposta de um GT, que também não tem nada fechado. Vamos voltar para a base, conversar com as comunidades, e nos preparar para fazer um enfrentamento duro e resolver essa situação”, afirma.
Semana de mobilização
A proposta de repassar o atendimento de saúde dos povos indígenas a municípios ou estados gerou reação do movimento indígena. A proposição ocorre num momento em que indígenas também vêm protestando contra o desmonte as políticas de saúde para seus povos. Denunciam cortes no pagamento de funcionários que prestam serviços nas aldeias e em convênios, além de falta de medicamentos, transportes e vacinas.
A Apib, no início da semana, convocou os povos indígenas para uma mobilização nacional. Nos dois dias em que os protestos tomaram o país, ao menos 51 povos protestaram, movimentando 18 estados e interditando 11 vias. Tanto em São Paulo quanto em Manaus os indígenas ocuparam prédios públicos.
Na capital paulista, o povo Guarani que vive na TI Jaraguá ocupou a prefeitura. Já a capital amazonense teve a sede do Dsei ocupada por cerca de 300 pessoas. Em ambos os locais, as lideranças afirmaram que permaneceriam até ter uma solução para os atuais problemas enfrentados na saúde indígena.
*Matéria do Cimi com edição do ANDES-SN