Volkswagen encara na Justiça denúncias de escravidão em fazenda apoiada por ditadura

Publicado em 28 de Maio de 2025 às 11h23. Atualizado em 28 de Maio de 2025 às 12h08

Uma das principais acusações de trabalho escravo da história do país começa a ser analisada nesta semana pela Justiça do Trabalho em Redenção, no Sul do Pará. A Volkswagen do Brasil é acusada de aliciar trabalhadores rurais e submetê-los a condições análogas à escravidão na fazenda Vale do Rio Cristalino, em Santana do Araguaia (PA), entre 1974 e 1986.

Em dezembro de 2024, após décadas de denúncias de organizações como a CPT (Comissão Pastoral da Terra) e sindicatos de trabalhadores, além de frustradas tentativas de acordo com a montadora alemã, o MPT (Ministério Público do Trabalho) denunciou a Volks por violações aos direitos humanos.

Na próxima sexta-feira (30), quatro trabalhadores escravizados depõem como testemunhas. A expectativa é que a sentença da Justiça saia no segundo semestre. A ação solicita um pedido público de desculpas e R$ 165 milhões em indenizações por danos morais coletivos.

“Quando tava na Volks não tinha dia não, a gente trabalhava até de domingo. Trabalhava de foice e morava no barracão de lona. Quando tinha chuva de vento, arrancava tudo”, conta à Repórter Brasil Raul Batista de Souza, de 66 anos, um dos trabalhadores convocados a depor.

O processo contra a Volkswagen se destaca pela abundância de documentos históricos, depoimentos, fotos, investigações parlamentares e reportagens no Brasil e na Alemanha nos últimos 40 anos. A documentação detalha episódios de violência, tortura, escravidão por dívida, perseguições e ameaças atribuídos a funcionários e intermediários da antiga fazenda da montadora na Amazônia, dedicada à pecuária e extração de madeira.

A ação destaca que estão presentes na denúncia os quatro elementos que, mesmo isoladamente, já configurariam a existência de trabalho escravo de acordo com a legislação brasileira: trabalho forçado, servidão por dívida, condições degradantes ou jornada exaustiva. O número de trabalhadores afetados é incerto.

Segundo a denúncia do MPT, os lavradores escravizados eram recrutados em cidades distantes e levados para atuarem na derrubada da mata nativa para abertura de pasto. A cada ano, até mil peões atuavam ao mesmo tempo em várias frentes de desmate. A CPT estimou na época ao menos mil vítimas.

“O gado tinha tudo. Uma equipe de agrônomos, controle por chip, um pasto fantástico, todo o acompanhamento que garantia a saúde e a engorda. Já para os trabalhadores não era oferecido nada. Havia o barracão precário, onde ficavam devendo após comprarem produtos para trabalhar e construir suas moradias. E eram impedidos de sair da fazenda, pois havia homens armados, ameaças de morte e captura de quem tentasse escapar”, resume o padre Ricardo Rezende Figueira, à época coordenador da CPT na região do Araguaia e Tocantins. “Agravando o problema, muitas vezes estavam distantes dos seus locais de origem”, continua.

Hoje professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), onde coordena o GPTEC (Grupo de Pesquisa do Trabalho Escravo Contemporâneo), ele foi um dos primeiros a registrar as denúncias dos trabalhadores, ainda na década de 1970.  Rezende também presta depoimento esta semana.

Antes de acionar a Justiça, o MPT se reuniu cinco vezes com a fabricante para tentar uma conciliação. A Volks, porém, se retirou das conversas em 2023, alegando não ser responsável pelos fatos.

Três anos antes, a empresa havia assinado um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o MPT, o Ministério Público Federal e o MP de São Paulo, reconhecendo a perseguição e tortura de ex-funcionários em sua fábrica em São Bernardo do Campo (SP) durante a ditadura militar (1964-1985) e aceitando pagar R$ 36 milhões em compensações. A companhia, porém, nunca admitiu culpa pelas denúncias envolvendo a fazenda no Pará.

Procurada, a Volkswagen do Brasil disse que “não comenta processos em andamento”.

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Fonte: Repórter Brasil, por Diego Junqueira

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