Gestão democrática e estruturação de carreira são pontos de pauta da categoria
Docentes da Universidade do Distrito Federal (UnDF) paralisaram as atividades nessa quinta-feira (15) e realizaram um ato em frente à Secretaria de Educação do DF. O protesto resulta de um longo processo de tentativas frustradas de negociação com a reitoria pró-tempore da instituição.
No dia 7 de agosto, docentes da universidade realizaram uma assembleia na qual aprovaram indicativo de greve e deflagração do movimento paredista em 29 de agosto, caso não haja mudanças no cenário de ameaças à liberdade de cátedra e de ilegalidades cometidos pela administração da UnDF. Muitos dos ataques ferem tanto a Constituição Federal quanto a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
A pauta aprovada pela categoria na assembleia cobra a instalação do processo de composição dos Conselhos Superiores da Universidade e nomeação imediata de docentes efetivos do quadro permanente para os cargos diretivos da UnDF, ambas nos termos do artigo 56 da Lei nº 9.394/1996 (LDB). As e os docentes exigem, ainda, o compromisso de vincular a criação de novos cursos à aprovação pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão e a Instalação imediata do processo de composição da Comissão Organizadora que coordenará, regulamentará e organizará o processo de escolha do(a) primeiro(a) reitor(a), do(a) primeiro(a) vice-reitor(a) e da administração superior da UnDF.
Dentre as demandas apresentadas também estão a anulação imediata de todas as designações compulsórias de disciplinas realizadas para o 2º semestre acadêmico de 2024 e efetivação das distribuições elaboradas e aprovadas pelos colegiados docentes de cada curso; e a instalação imediata de Mesa de Negociação com representantes da Seção Sindical dos Docentes da UnDF, da Unidade de Administração Geral da UnDF e da Secretaria de Estado de Economia para tratar da proposta de reestruturação da Carreira Magistério Superior do Distrito Federal.
A carreira imposta, no momento, para as e os docentes da UnDF se baseia na mesma aplicada aos professores e às professoras da Educação Básica do DF. Ou seja, não há perspectiva de progressão, não há regime de tempo de dedicação exclusiva e boa parte do corpo docente atua em regime de 20 horas. A pauta completa da categoria abrange 14 pontos de reivindicação. Confira aqui o documento.
A reitoria respondeu à pauta da categoria. No entanto, o retorno não atende às reivindicações apresentadas. "A primeira resposta da reitoria foi insuficiente, não atende à pauta e mantém a tentativa de tutela do corpo docente e discente. E, se há uma tentativa de tutela, está em desacordo com a gestão democrática que reivindicamos. Uma universidade não pode funcionar assim, com um grupo tutelando o outro”, explica Bruno Gontyjo do Couto, presidente do Sindicato de Docentes da UnDF (SindUnDF Seção Sindical do ANDES-SN).
De acordo com Couto, uma nova assembleia será realizada na próxima semana para avaliar coletivamente a resposta da administração da UnDF e também os próximos passos da mobilização. "Nós, docentes, vamos continuar mobilizados até que a reitoria pró-tempore se comprometa com a construção de uma universidade democrática e de qualidade", afirma.
Precariedade, falta democracia e evasão
Em pouco mais de um ano de funcionamento, a UnDF já enfrenta sérios problemas de precariedade, falta de gestão democrática e evasão de discentes. Fundada em 2021, a universidade teve o primeiro grupo de docentes empossado em 2023 e as aulas iniciaram em julho do ano passado.
Para montar o corpo funcional da universidade, o governo do Distrito Federal realizou apenas concurso para docentes. As funções técnico-administrativas são desempenhadas por um grupo de servidores e servidoras da Secretaria de Educação do Distrito Federal, que atuava na Educação Básica. A reitora pró-tempore foi indicada pelo governador e tem mandato até junho de 2025.
Após assumirem seus cargos, docentes buscaram ampliar a participação na construção do projeto de universidade democrática e autônoma. No entanto, esbarraram em uma série de impedimentos e imposições da administração da instituição.
Os Projetos Pedagógicos de Cursos (PPCs) já estavam elaborados antes mesmo do corpo docente ser nomeado, assim como a metodologia aplicada já estava definida. “Os docentes estão ali apenas para executar o projeto”, critica o presidente do SindUnDF SSind.
Diante da ausência da liberdade de cátedra e de um movimento para composição dos Conselhos Superiores e órgãos colegiados, essenciais para o funcionamento de qualquer universidade, desde agosto do ano passado a categoria busca diálogo com a reitoria para a construção de um projeto coletivo.
Durante o período de recesso de férias, em fevereiro de 2024, a reitoria tento instalar um Conselho Universitário, em total desacordo com o artigo 56 da LDB. O edital de instalação do Consuni foi questionado na Justiça pela seção sindical, pois previa apenas a participação de 20% de docentes. A seção sindical entrou com um mandado de segurança coletivo e conseguiu, inicialmente, uma liminar que suspendeu o edital.
Em um agravo apresentado pela UnDF, foi argumentado que parte das vagas no Consuni seriam ocupadas por servidores que também são professores. No entanto, ao analisar o mérito, em segunda instância, o desembargador Arnoldo de Assis reafirmou a violação da LDB. “Com efeito, mesmo que se reconheça a peculiar formação histórica da UnDF, o fato é que a composição dos seus órgãos colegiados por setenta por cento (70%) de docentes, como determina o art. 56, parágrafo único, da Lei nº 9.394/96, parece exigir uma interpretação que compreenda no conceito de docentes apenas os integrantes da Carreira de Magistério Superior do DF, nomeados em concurso público”, aponta a sentença do magistrado, emitida em julho deste ano.
Outro problema grave aprontado pela categoria é a impossibilidade da revisão dos PPCs elaborados sem a participação do corpo docente e, também, de cursos que estão sendo implementados sem o consentimento das e dos docentes. Além disso, professoras e professores estão sendo designados compulsoriamente para aplicar disciplinas para as quais não têm formação.
Bruno Gontyjo Couto alerta que todas essas situações, e outras vivenciadas na universidade, afetam diretamente a qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão desenvolvidos na instituição, e implicam também em aumento da já alta evasão. Segundo dados da SindUnDF SSind, pelo menos 30% das e dos estudantes abandonaram seus cursos já no primeiro semestre. Nos cursos noturnos, essa taxa pode chegar a 50%.
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